Em 2024, aposentados e pensionistas de Mato Grosso do Sul apresentaram queixas aos Procons locais contra 121 entidades acusadas de descontos indevidos em benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Isso representa um resultado três vezes superior ao número de entidades associativas contestadas diretamente ao INSS após a Operação Sem Desconto, deflagrada em 23 de abril deste ano.

De acordo com a procuradora estadual Carla Cardoso Nunes da Cunha, não se pode afirmar que todas essas entidades estavam envolvidas em alguma ilegalidade, pois podem haver reclamações improcedentes. No entanto, o fato de que 121 entidades foram questionadas por descontos indevidos em apenas um ano é um número significativo e merece ser investigado.

O número de organizações sociais questionadas foi obtido a partir da análise de cerca de 4 mil queixas registradas por 23 Procons municipais que responderam a uma pesquisa feita pela Procuradoria-Geral. Além disso, 34 cidades sul-mato-grossenses não contam com um Procon, o que pode significar que o problema seja ainda maior do que o registrado.

A procuradora Carla Cardoso chama a atenção para o fato de que, durante parte do período analisado, apenas 29 entidades em todo o país tinham autorização para cobrar mensalidades associativas por intermédio de desconto direto em benefício previdenciário. Para isso, elas precisavam cumprir as exigências da Instrução Normativa nº 162, do próprio INSS.

A instrução determina que as entidades precisam ter assinado um acordo de cooperação técnica com o INSS e que as autorizações dos beneficiários devem ser feitas com o uso de biometria, assinatura eletrônica, não sendo aceita procuração. A procuradora afirma que, se essa instrução fosse observada, problemas como os descontos associativos indevidos seriam evitados.

Diante da gravidade da situação, integrantes do Conselho de Defesa do Consumidor do Mato Grosso do Sul cogitaram ajuizar uma ação civil pública para obter mais informações do INSS. No entanto, essa hipótese foi abortada quando a recente Operação Sem Desconto revelou que o problema não estava circunscrito ao Mato Grosso do Sul.

O relatório da Procuradoria-Geral foi entregue à Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, à Controladoria-Geral da União e ao Ministério Público Federal. Nele, há várias recomendações, incluindo que os três órgãos públicos apurem a situação das entidades alvo das reclamações de aposentados e pensionistas sul-mato-grossenses que não constam da lista de empresas já investigadas no âmbito da Operação Sem Desconto.

O delegado Reginaldo Salomão, titular da Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Contra as Relações de Consumo, concorda que o trabalho dos órgãos estaduais de defesa do consumidor foi dificultado pela falta de colaboração de representantes do INSS. Ele afirma que, em 2024, tentaram ouvir o representante da autarquia no estado, mas ele não prestou nenhum esclarecimento sobre as reclamações que o Procon vinha recebendo.

Já o INSS informou que não recebeu cópia do relatório da Procuradoria-Geral e que, por isso, não comentaria o assunto. A autarquia também não se pronunciou sobre os comentários de Carla Cardoso e do delegado Salomão.

Até as 17h de terça-feira, mais de 2,672 milhões de aposentados e pensionistas de todo o país contestaram os descontos de mensalidades associativas cobrados em favor de 41 entidades. Dos cerca de 2,743 milhões de beneficiários que consultaram a autarquia, apenas 71.298 afirmaram ter autorizado o desconto.

A mensalidade associativa é uma contribuição que aposentados, pensionistas ou pessoas de uma determinada categoria profissional pagam, periodicamente, para integrar uma associação, sindicato ou entidade de classe sem fins lucrativos que represente os interesses de seus afiliados. O desconto em favor das entidades autorizadas a oferecer a facilidade está previsto na Lei dos Benefícios da Previdência Social, em vigor desde 1991.

A Advocacia-Geral da União pediu à Justiça Federal que determine, cautelarmente, o bloqueio de bens de 12 entidades associativas, bem como de seus dirigentes, totalizando R$ 2,56 bilhões. A ação movida pela AGU foi desmembrada em 15 diferentes processos judiciais e os pedidos de bloqueio estão sendo julgados em blocos.

Até o momento, a Justiça Federal já determinou o bloqueio de R$ 119 milhões em bens de empresa e seus responsáveis citados em cinco das ações movidas pela AGU.